terça-feira, 21 de abril de 2020

O Mistério do Real



Era uma vez um poderoso rei e seu filho, o príncipe. Quando este atingiu a idade de viajar pelo mundo o pai o chamou e disse: aproveite a viagem , só te deixo um alerta: não existem ilhas, não há princesas, não existe Deus. Não vá deixar ninguém te enganar.

Quando estava a algumas milhas viajando em seu barco, no entanto, o príncipe viu grandes aglomerações de terra com maravilhosos bosques e florestas e, em cada uma delas, seres misteriosos e belos dos quais não se arriscava a dar nome. Parou em uma daquelas terras que se erguiam no oceano e encontrou um senhor, vestido com um manto belo como a noite, ao qual resolver perguntar:


-o que são estes montes de terras?
-são ilhas, respondeu o sábio.
-não pode ser!?! E aquelas criaturas misteriosas? Oque são?
-são as mais belas princesas,
-como isso é possível? Antes de iniciar minha jornada meu pai me avisou que não existem ilhas, nem princesas e nem tampouco Deus... Mas espere? Quem é o senhor?
-muito prazer, sou Deus, respondeu o sábio ao príncipe.



O príncipe ficou assustando, e rapidamente navegou de volta a seu pai, narrou a ele o ocorrido pedindo explicações. Acaso o pai havia mentido?


-espere, disse o rei, como este distinto senhor se vestia?
-com um manto escuro, da mesma cor da noite, disse o jovem.
-está explicado! Tu foste enganado por um mago!


O jovem volta navegando até a ilha em que reencontra o senhor, ao qual desafia:


-agora sei a verdade, e tu não me enganas, tu não passa de um mentiroso mago! Serás punido com a morte por haver mentido ao príncipe!
-espere meu jovem, tens razão! Sou apenas um velho mago. Mas antes de me punir, preciso que saiba que apenas sigo as ordens do mais poderoso mago que há, teu pai, aquele que chamas rei, me ordenou que te dissesse tudo isso, e saiba que aquelas são verdadeiras ilhas, e aquelas são verdadeiras princesas.

Transtornado o jovem navega de volta para casa, conta o ocorrido ao pai, e este, com um sorriso misterioso no rosto arregaça as mangas da túnica real, onde se percebe por baixo uma túnica da mesma cor da noite.


-filho, é isto, eu sou apenas um mago que joga o jogo de ser rei, e usei de todo este artifício para que soubesses a verdade
-mas agora para mim chega, disse o príncipe, eu quero saber o que existe de verdade, para além das ilhas, das princesas e de toda essa magia,
-não existe nada além da magia, sorriu o rei


O jovem pensou um pouco na beleza das ilhas e no encanto da jovem que, entre as princesas mais belas, havia feito bater mais forte o seu coração, e pensou que era possível aceitar a realidade que não há verdade além da magia!



***


Através dessa história, podemos falar da jornada de nossa consciência em busca do esclarecimento. Num primeiro momento, ser confrontados com uma verdade maior do que somos capazes de suportar é um problema. Lacan muitas vezes expressa que a vida é enigma, fazendo referência à dimensão do Real que não somos capazes de apreender completamente, expressa na nossa história como magia.

Curioso apontar que o jovem de nossa história tem a pulsão do conhecer, que se expressa no desejo de viajar e de perguntar sobre as realidades que não entende, buscando assim explicações.

Ao sermos confrontadas com situações que não compreendemos, com os desafios da vida, sofremos o traumatismo que é normal da vida. O jovem da história segue sua jornada até atingir uma nova compreensão, semelhante a uma iniciação, a qual recebe de seu pai, que buscava apresentá-lo ao enigma da magia, representando aqui os desafios, segredos e mistérios da vida.

Ao integrarmos a nova realidade com uma nova interpretação ou nova compreensão, transformamos o Inconsciente em consciente, integramos o traumatismo, atingimos graus maiores de compreensão simbólica.

O pai do jovem, na figura de um mago que representa um rei, é um ótimo exemplo do que Lacan vai chamar de Sujeito suposto do saber, posição que deve ser sustentado pelo analista no início da terapia para que se de a transferência. Não podemos apresentar de cara a magia, o mistério do não saber, o não sentido do Real. Através do conhecimento, da posição de suposta autoridade e experiência, o analista captura o analisando para um processo de autoconhecimento até que este seja capaz de suportar o não sentido.


Att, Pedro Possidonio. 
Psicólogo e Terapeuta.






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