domingo, 19 de abril de 2020

Sintoma e Teoria de Lacan



Sempre que falamos em Lacan devemos ter em mente que ele se propõe a fazer um retorno à Freud. Uma frase significativa dele no final da vida foi: sejam lacanianos se quiserem, eu sou freudiano. Isso significa que tudo aquilo que falamos para Freud vale para Lacan. O que o célebre psicanalista francês buscava era preencher as lacunas daquilo que o pai da psicanálise havia criado mas, segundo ele, não havia enunciado por completo, não havia se dado conta ou não teve oportunidade de dar continuidade durante seu trabalho. Claro que este ponto é discutível nos meios psicanalíticos, onde muitos apontam que o que Lacan fez foi em outro sentido completamente diferente do de Freud, mas esta discussão foge ao escopo de nosso trabalho.

Para nós importa agora falar das contribuições lacanianas para o desenvolvimento da psicanálise. Iniciaremos pelo conceito de Sinthoma, no qual Lacan faz referência ao grego Symptome, aquilo que cai, significado que faz Lacan apontar que o Sintona deve cair durante a análise. Vale marcar a diferença entre sintoma, iniciando com minúscula, termo idêntico ao de Freud, e Sinthoma ou Sintoma, com s maiúscula, fazendo assim referência ao ganho conceitual de Lacan.

No seminário 23, dedicado ao Sinthoma, Lacan coloca este conceito como sendo uma espécie de amarra que faz com que a estrutura da psique continue enodada em forma de cadeia, impedindo essa estrutura de se tornar uma estrutura paranóica, portanto psicótica, ou seja, a psicose paranóica seria para Lacan a base do funcionamento psíquico, a neurose seria um construção posterior, a nível de emenda, fazendo com que a estrutura borromeana da psique se mantenha unida e continue circulando na cadeia infinita de significantes.



Para acrescentar ao entendimento da teoria lacaniana, vamos esclarecer o que seria o nó borromeano. Esta imagem seria um nó de três círculos fazendo uma intersecção mútua, à semelhança da teoria dos conjuntos da matemática onde os conjuntos X, Y e Z se intercruzariam gerando quatro campos de intersecção entre eles. A imagem é uma figura náutica, o nó borromeano seria um nó de marinheiro idealizado para passar firmeza às amarrações que dela necessitem.




Os três conjuntos que compõem o nó borromeano de Lacan são seus conceitos de Real, Simbólico e Imaginário. Simbólico tem a ver com o registro comum às culturas: o alfabeto, os símbolos matemáticos, a linguagem, as metáforas, histórias, contos, tudo isto que está na cultura e que Lacan chamava de Outro, ao menos uma das definições deste conceito o qual não iremos aprofundar.

O Imaginário é o campo do corpo, do registro sensorial. Inicia com a imagem de nós mesmos que vamos percebendo na primeira infância e aprendendo a associar com o eu. A essa imagem do eu aprendemos a coordenar nossas impressões, percepções, o modo como de maneira mediata percebemos e respondemos ao mundo com nossos sentidos. Corresponde, a título de comparação e entendimento, ao que a Melanie Klein chamava de Imagem Inconsciente do Corpo.

Já o Real é o registro impossível em relação ao imaginário, ou aquilo que não cessa de se inscrever em relação ao simbólico. Sempre nos escapa, nunca podendo ser totalmente entendido ou aprendido, fonte de uma dimensão de estranhamento que nos faz remeter ao conceito de estranho em Freud, ou infamiliar (Unheimlich). O Real é fonte de angústia. Aquilo que não tem sentido nem nunca terá, para relembrar a famosa música.

Na intersecção de Real, Simbólico e Imaginário está o objeto a (autre - outro). Objeto perdido do desejo e causa do desejo. Quando falamos, em Freud, que um dos destinos possíveis da pulsão é sua satisfação direta, ressaltamos que está satisfação nunca é completa, uma parte sempre fica faltando de ser aliviada, sempre permanece como desejo insatisfeito, e é esta parte que Lacan vai nomear objeto a.

Em outro momento referido como A Coisa, jamais apreendida ou com compreendida pelo eu, mas muitas vezes substituídas pelos diversos objetos que o eu elenca como alvos para seu desejo. Uma vez atingidos, como nunca atingimos o Real ou o Objeto a, acabamos apenas por substituir um alvo por outro, um desejo por outro, continuando nisso processo de desejo e de busca, fazendo do ser humano um eterno buscante.

No campo de intersecção entre simbólico e Imaginário temos o sentido. Tanto o sentido que danos ao que falamos quanto o sentido por exemplo do signo 3 que é três. Na intersecção do Real com o Imaginário temos o campo do Outro, ou o gozo do Outro, que pode ser a cultura, o grande Outro inicial que é a mãe, ou a imagem que recebemos refletida quando dizemos o que dizemos, o sentido que para o outro toma o que comunicamos.

Na intersecção entre Real e Simbólico temos o Gozo fálico, outro importante conceito lacaniano. O gozo seria uma espécie de prazer Inconsciente, é o resultado do trabalho do Inconsciente. Prazer que pode ser entendido como alívio por exemplo, diminuição das tensões pulsionais quando se manifesta um sintoma, lapso ou chiste. O prazer de falar um palavrão ou daquilo que fazemos mas não podemos contar para ninguém.

Quando fala de Joice no seminário sobre o Sintoma, Lacan diz que sua arte é um Sintoma, com S maiúsculo, ou seja, a arte aqui atua como uma amarra impedindo o artista de cair numa estrutura psicótica. Assim temos em Lacan uma nova ideia do objetivo da arte para além da Sublimação de Freud.

Para esclarecer ainda mais a teoria de Lacan, vamos agora falar em signo, significado e significante. Signo é a dimensão da imagem que percebemos, a forma que desenhamos o 3 por exemplo. Já o significado de 3 é três, ou three, ou drei. O significado está no campo dos acordos coletivos que fazem uma imagem ser interpretada de uma determinada maneira. As cores verde e vermelha em sinais de trânsito no mundo todo, praticante, indicam que se pode seguir ou que se deve parar, por exemplo.

Já o significante pertence ao campo da associação livre. Uma mesma imagem como um peixe em um sonho pode ter significados diferentes a depender do sonhador, ou até mesmo para o mesmo sonhador em diferentes épocas. Este nível do significado que cada um da e a cada momento, baseado na associação livre, na conexão íntima de sentido para cada um é a dimensão do significante. O professor Paulo Bregantin completa dizendo que signo é significado é p mesmo para todos, já o significante é diferente para cada um, ou seja, torna cada um o que é, é a diferença que faz de nós indivíduos.

Uma das formas de enunciar o objetivo da terapia para Lacan é fazer com que o indivíduo possa deslizar na cadeia de significantes de forma mais fluida, pois a vida é fluida, é mudança. A atitude neurótica é a da repetição. O neurótico se repete, sempre repete em palavras e atos o mesmo movimento, ficando fixado ao seu traumatismo, apegado a uma ideia fixa de si ou da vida. Superar esta insegurança neurótica e se permitir abrir para novos significados é um dos objetivos de amadurecimento da terapia psicanalítica.

Att, Pedro Possidonio. 
Psicólogo e Terapeuta.






Para saber mais sobre nosso trabalho, você pode visitar nossas páginas na Internet:









*Instagram: @pedropossidonio.psi










Qualquer necessidade, entre em contato conosco através do nosso email: 


Ou através do WhatsApp:
(85) 9.9688.8876.

Nenhum comentário:

Postar um comentário